Quão estranho é estar no meio de uma multidão e sentir-se singular, ouvir os seus murmúrios, a intensidade da suas vozes, o som das suas gargalhadas, os risos escondidos e mesmo assim parecer que entrei numa sala vazia com a televisão ligada. Sons de fundo, não me dizem nada e talvez não devesse ser assim.
Sento-me com as crianças, brinco e magoo-me, rio, despenteiam-me, sinto-me melhor com elas e talvez não devesse ser assim.
Sou um adulto, responsável por vezes demasiado independente, difícil de pedir ajuda a alguém, cruel e fria muitas vezes, mais do que as que queria, que não espera nada do mundo excepto o que conquista, que não confia, que segura um velho e uma criança pela mão e os ajuda os dois a travessar a estrada. Sei que gostam de me ver nesta posição, transmito-lhes força. Também gosto por vezes mas nem sempre e talvez não devesse ser assim.
Sentirmo-nos sós entre os mais, por vezes entre tanta gente!... Oh!... Os sons de fundo podem confundir-nos, mas não os devemos valorizar demasiado. Dissolvem-se... Aliás durante a vida ouvimos sempre ruídos de fundo. São os que estão em desacordo connosco, são igualmente os que nos aprovam, mas sentem vergonha de se exporem perante uma assembleia por nós. É belo sermos simples, crentes e ingénuos como a maioria das crianças, e estar à altura delas, e não exigirmos que elas se coloquem à nossa altura... Cruel e fria, Emília?!... Não! Talvez esquiva, amedrontada, receosa (seme permite...)... Quem escreve de si o que escreve não pode ser cruel. A frieza nas relações é timidez. Repare que só podemos dar muito amor aos outros, se recebemos igual quantidade e qualidade de amor na infância, se nos deram muito colo, e nos mostraram o lado doce da vida, a beleza da simplicidade, do convívio, da tolerância. Tudo o que nos conquista, é nossa conquista também. A independência, minha amiga, conquista-se. E procura-se na bondade, no saber olhar o outro da forma que ele mais precisa. Os mais precisam de nós. Nós precisamos deles. Creio. Não é o génio, nem o amor, nem a glória que medem a elevação de uma alma, é a Bondade! O tempo de vida que nos resta é pouco para transmitirmos bondade, entreajuda, condescendência. Amemos tudo quanto possamos fazer pelos outros, e mamemo-los!... Emília!... Isto não é "sermão", nem qualquer lição de "mestres", mas simplesmente um programa de vida, um programa para uma vida inteira. Faço-me compreender?... Grato pelo seu desabafo sincero, espelho do quanto sente, que sei que sente muito, muito mais do que aparenta... Olhe, Emília, as crianças, como se fosse igualmente uma criança!... Que belo!... Veja, considere o que lhe digo, ainda!... Eu desejava ser sempre criança nas horas que mais me apetecia sê-lo, confesso-lhe...E são muitas essas ocasiões. Não tenho pejo de lhe dizer. Sim! Diga não ao "talvez não". Com consideração.
ResponderEliminarNa 13ª linha, uma gralha: "amemo-los", e não, "mamemo-los". Seria para ter graça, todavia, não passa de gralha na própria pressa com que escrevo. Perdoa-me, certamente!
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