Passei o dia a pintar aquela tela das mais vivas cores, das mais certas dores, dos meus velhos amores. Está perfeita parece-me mas deixa-me dar uns passos atrás, um daqueles longos, afastados, sem medo de forma a poder ver todo o cenário. Sim está perfeita, ninguém diria aliás como foi que a pintei, que tintas usei, com que mão muitas vezes trémula a desenhei. Acabei, não lhe toco mais. Atiro o pincel para dentro do copo de água cristalina mas a conspurca aos poucos e poucos formando ondas de cor tingida ao ser remexida. Devia ter-lhe dito o quanto me magoou, me fez sentir usada e descartada, com tão pouco valor. Dizer que não está tudo bem, que nunca esteve e que agora é simplesmente tarde demais. Tarde demais. Estou cansada, preciso descansar, talvez chore mais logo quando me for deitar quem sabe, apenas a almofada o dirá. O pincel está limpo agora que o tirei do copo, não tem sombra de cor, tudo ficou naquela tela.
(Este blog é totalmente dedicado a Laura e Lara, para quem todas as mensagens que aqui posto, me dirijo. Sem dizer adeus.)
sexta-feira, 30 de março de 2012
quarta-feira, 28 de março de 2012
"Ondas do mar"
Existem tantas pessoas, ideias, momentos, histórias, passos, impossíveis de repetição, de nova e igual emoção, que nos traz uma certa saudade melancólica mas também um prazer imenso nos sabores que vêm à boca, os cheiros intensos, vermelhos rubores, arrepios de frio num dia de verão, perfeitas cores que aos olhos já cegos desses tempos se mostram e se colam ao vento que agora nos cerca os dedos das mãos quando às janelas as fazemos ondular como as ondas do mar, esse mar que se nos entranha na alma onde se escondem todos os segredos por revelar.
sexta-feira, 23 de março de 2012
"Mãe"
Uma mulher abraça em seu leito o mundo inteiro num sorriso, no sopro que vem da criança que está em seus laços. É uma mãe dizes. Porquê mãe? Poderá ser mãe, irmã, ama, tia, avó ou quem sabe uma desconhecida que se agarra nesse sono os sonhos e que tens razão é mãe também.
quarta-feira, 21 de março de 2012
"O que dizer"
Que palavras tenho mais para dizer, falar escrever senão as que já tenho repetido cá dentro vezes e vezes sem conta, sempre as mesmas, no mesmo pensar, no mesmo murmurar, talvez por estradas ou caminhos diferentes por vezes mas que conduzem sempre ao mesmo vibrar no divagar que os dias me trazem. Ainda assim as palavras vêm como se ainda não as conhecesse e sem permissão entram de rompante por portas e janelas. O que querem dizer não sei mas as aguardo ansiosa pela forma como vou responder.
terça-feira, 20 de março de 2012
"Beleza"
A paixão dos que tentam reinterpretar a beleza do que vêem e sentem jamais morrerá nos corações daqueles que sabem o que é amar.
sexta-feira, 16 de março de 2012
"Língua"
Uma palavra numa língua longe soa estranha, estranha com outro som em outro tom, diferente, dizendo o mesmo. Essa língua distante não é mãe mas irmã e se prende em seus símbolos quando me faz encostar nas paredes e escutar o silêncio e o bater dos tambores na vibração constante, crescente, descendente mas continua que electrifica, gela e sua no tremedouro dos tempos. Ouço o seu ritmo, argumento, sentimento, páginas soltas de um livro inacabado, rasurado mas desenhado em traços imprimidos de pele a pele.
quinta-feira, 15 de março de 2012
"Realidade"
Às vezes penso e por pensar confio nessa estranha sensação de gozo que na realidade não existe, mas se existisse seria o que sinto nas horas em que prendo a razão à guilhotina e me permito ser o que acho que sempre fui, aquele a quem se dissipam as névoas no sopro do coração, vence as batalhas sem magoas e que sabe que a realidades das coisas está muito para lá do que se vê e muito mais perto do que se toca.
quinta-feira, 8 de março de 2012
"Olhares"
Existe um tempo entre o tempo e o espaço que não sei como se chama ou chamam ou mesmo se terá nome. É olhar nesse olhar e dizer sou eu que ali estou ou sou e não outro que responde de igual modo. Como pode alguém não se reconhecer se no mesmo olhar se olha.
domingo, 4 de março de 2012
"Chuva"
Um pingo cai, se esmaga no chão seco, compacto, teso, preso, a poeira levanta e o ar que se cheira e se prende na garganta fica a saber a terra, essa terra que se apresenta estendida com sementes nos seios e anseios pela saliva dos céus cinzentos, não pretos nem brancos mas cinzentos na monocromática figura da harmonia das suas ondas. Outro pingo e outro e outro, cedo se forma uma poça, uma lagoa, um rio no corredio das valas, barrocas, margens levando e levantando o que encontra dos que fogem dessa agua fria que queima e se entranha, por medo de serem de papel ou mel, depois de aos seus refúgios chegarem e a ficarem a admirar. Essa água alimenta não mata, transforma e não toma, compõe canções com os sons que produz ao tocar em cada pedaço de ser, cada pedaço de ter, e à noite quando estiver estendida no meu leito, estenderá os seus braços das telhas às estradas como se de mantas se fizessem a envolver o seu bem amado.
sábado, 3 de março de 2012
"Mãos"
Iguais às das crianças, dedos um pouco gordos, tortos, talvez não tanto quanto se amostram mas como se apresentam nas regras dos desenhos arquitectónicos. Têm subtis cicatrizes que apenas os olhos experientes descobrem por conhecerem as suas lendas. São macias, secas, duras, curtas, imensas para os seus dizeres e afazeres, quase poderiam iludir pelo aspecto que têm a quem pertencem, não fosse as linhas azuis das silhuetas das árvores despidas no inverno tatuadas nas suas costas. Falam se a voz não soltar, como esponjas cheiram ao que se agarram e escutam, olhos do que não vê, aquecem e arrefecem no que sendo a primeira pele assim tocam no que se encostam na matemática da proporção.
Subscrever:
Mensagens (Atom)